
A Paraíba foi destaque dentro de uma matéria do O Globo, que trouxe as movimentações e tentáculos da máfia italiana no Brasil. Os mafiosos movimentaram R$ 12 bilhões em negócios de fachada, incluindo operações na Paraíba. Confira a matéria abaixo.
No fim de 2020, investigadores monitoravam as conversas de mafiosos do clã de San Luca da ‘Ndrangheta em um aplicativo criptografado quando chamou a atenção uma série de mensagens enviadas de um contato vindo do outro lado do Oceano. “Eu tenho o Brasil e o Equador, compá”, escreveu o italiano Vincenzo Pasquino, ostentando a sua influência como correspondente da ‘Ndrangheta na América Latina. Àquela época, o criminoso percorria cidades do litoral brasileiro, como Guarujá (SP) e João Pessoa (PB) em busca de selar parcerias com o Primeiro Comando da Capital (PCC) para escoar drogas e lavar dinheiro do tráfico. Em maio de 2021, ele foi preso pelas autoridades brasileiras. No ano passado, foi extraditado para o seu país de origem, onde fechou um acordo de delação premiada com a Justiça.
As revelações de Pasquino subsidiaram inquéritos no Brasil e ajudaram a Polícia Federal e o Ministério Público a mapear a atuação das máfias italianas no Brasil.
— Ele revelou detalhes sobre as conexões da máfia com facções criminosas brasileiras e esquemas de lavagem de dinheiro que sustentavam suas operações no Brasil. O impacto dessas ações conjuntas é significativo, pois atinge diretamente a infraestrutura criminosa utilizada pela máfia, tanto no tráfico de drogas quanto na lavagem de dinheiro — afirmou o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues.
Além de ver o país como uma rota estratégica no tráfico de drogas, os grupos criminosos são suspeitos de explorar de empresas fantasmas ao garimpo ilegal de ouro da Amazônia para lavar dinheiro ilícito e contam até com “concierges do crime” — brasileiros que se tornaram espécie de “faz tudo” dos traficantes transalpinos.
Reportagem do GLOBO analisou mais de 3 mil páginas de relatórios de investigações de autoridades brasileiras e europeias que apontam que as máfias italianas movimentaram cerca de R$ 12 bilhões desde 2009 até então. Somente nos últimos dez anos, foram presos no Brasil pelo menos 25 italianos ligados a organizações criminosas como Cosa Nostra, ‘Ndrangheta e Camorra.
Segundo investigação da PF, um dos suspeitos de atuar como concierge da máfia italiana é Anselmo Limeira de Oliveira, um ex-assessor parlamentar da Câmara Municipal de João Pessoa, capital da Paraíba, que chegou a se candidatar a vereador no ano passado, mas não se elegeu. Seu nome consta como sócio de uma construtora que fechou contratos com o governo paraibano e a prefeitura de Queimadas (PB) entre 2017 e 2019. Segundo o inquérito, a empresa não possuía “funcionários ou local físico” e era utilizada para “lavar o dinheiro sujo do tráfico de drogas”. Procuradas, as defesas de Oliveira e dos órgãos públicos não se manifestaram.
A relação de Oliveira com a máfia italiana é conhecida pelas autoridades desde 2021, quando ele foi pego reunido com dois ilustres mafiosos da ‘Ndrangheta em um flat na praia de João Pessoa. Eram eles: Vincenzo Pasquino e Rocco Morabito, conhecido como o “Rei da Cocaína de Milão”, que, à época, era o segundo homem mais procurado da Itália.
Segundo as investigações, Oliveira fornecia documentos aos estrangeiros e fazia a intermediação com corretores de imóveis que despertavam o interesse de Morabito e Pasquino. Em mensagens interceptadas pela PF, ele também foi pego negociando a venda de armas e drogas. Paralelamente aos serviços prestados aos traficantes, Oliveira organizava campanhas políticas em comunidades de João Pessoa, indicava parentes para cargos na prefeitura da capital da Paraíba e pedia contratos na área de construção. “Se puder me ajudar com pequenos serviços, ficarei grato. Depois certamente entrarei nas licitações e pegarei outros serviços maiores”, diz ele em uma mensagem.
Em nota, a prefeitura de João Pessoa ressaltou que o prefeito e a primeira-dama – a quem ele enviava as mensagens – não são alvos do inquérito e não tinham “relação pessoal nem tampouco conhecimento sobre fatos da vida pregressa” de Oliveira, que já havia sido preso por tráfico de drogas.
“Diante do exposto constata-se que Anselmo seria para os estrangeiros uma “espécie de faz tudo”, sendo inclusive o responsável pela locomoção dentro da cidade, aluguel de apartamentos, flats e hotéis para hospedagem dos estrangeiros”, diz o relatório da PF, acrescentando que há “fortes evidências que comprovam a ligação de Anselmo com os estrangeiros, apontando desta vez para o tráfico de drogas, possivelmente internacional”.
Tesoureiro da máfia
Para delegados e especialistas, a máfia italiana tem vindo ao Brasil de olho nas oportunidades de aquisição de condomínios, hotéis e restaurantes para branquear os lucros oriundos do tráfico de drogas, das extorsões e redes de prostituição — assim como faz na costa do Mediterrâneo. Esse movimento ficou evidente na Operação Arancia, deflagrada em agosto de 2024 contra três italianos ligados à máfia siciliana Cosa Nostra.
Entre os alvos estava Giuseppe Calvaruso, apontado como o “tesoureiro” da organização e responsável pelo “reinvestimento do capital ilícito siciliano” — ele está sob custódia na Itália após ter desembarcado do Brasil para passar a Páscoa com parentes em 2021. Segundo a procuradoria, seu grupo movimentou cerca de R$ 300 milhões por meio da compra de apartamentos, flats, loteamento de casas, pizzaria e cafeteria em cidades do Rio Grande do Norte e da Paraíba, incluindo Natal e João Pessoa. Entre as empresas do suposto esquema, está a “América Latina Hemisfério Investimentos Imobiliários”, que tem capital de R$ 100 milhões.
Em troca de mensagens com mafiosos de Palermo, Calvaruso foi flagrado detalhando o potencial de investimentos no Brasil: “Faz a proposta de investir 30 mil euros e garantimos daqui até dezembro devolvermos 150 mil euros. Para eles é muito dinheiro, mas para nós são migalhas pois vamos ganhar o dobro”. Em outra conversa, ele garante que “salva tudo e todos” e nunca “volta de mãos vazias”.
Confira a matéria na íntegra clicando aqui.
Fonte: O Globo
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