No último dia 3, o ministro de Minas e Energia Alexandre Silveira esteve na Câmara dos Deputados e disse que gostaria de modificar o dispositivo da lei de privatização da Eletrobras que obriga a União a comprar energia de termelétricas pelas próximas décadas.
O presidente quer restaurar o poder do governo de ditar os rumos da empresa, ferindo a lógica de um processo de desestatização que foi discutido pelo Congresso, rediscutido pelo TCU e que já produziu resultados, com R$ 28 bilhões de investimentos na companhia.
Faz sentido para um governo de mentalidade estatizante, mas a oposição será ferrenha. Só a esquerda mais envelhecida insiste que vale a pena comprar essa briga.
Lula talvez aposte no fato de que as decisões do STF são cada vez mais imprevisíveis. A corte, e não o futebol, é a verdadeira “caixinha de surpresas” do Brasil de hoje. Até mesmo a coisa julgada, em teoria imutável, foi transformada em coisa incerta pelos ministros: eles cogitam desprezá-la em processos tributários, flertando com o caos.
Não se pode desprezar, portanto, a hipótese de eles decidirem interferir em uma privatização já consumada, alterando as premissas apresentadas a quem concordou em despejar dinheiro na Eletrobras.
Apesar de tudo, a crença majoritária ainda é a de que o STF vai rejeitar a ação ajuizada pela Advocacia Geral da União (AGU). Como disse a Eletrobras em um fato relevante divulgado nesta segunda-feira, 8, o processo de desestatização “seguiu fielmente todo o trâmite legal previsto”. Ignorar esse fato equivale a jogar na lama a segurança jurídica – e riscar o Brasil do mapa dos investidores internacionais.
Diante de duas batalhas possíveis, a das termelétricas e a da privatização, Lula escolheu a que tem menos chances de produzir algum resultado.
Deixo para os psicólogos discutir o papel que o ressentimento, a arrogância, o dogmatismo, o desejo de impor sua vontade a qualquer custo ou uma combinação de todas essas coisas desempenham nessa decisão — companheira, aliás, da tentativa recente de anular por decreto os principais avanços do marco do saneamento. Chamo a atenção para outra questão política.
As termelétricas não tinham nada a ver com a desestatização da Eletrobras. Não precisavam estar no projeto. Foram incluídas nele na reta final da tramitação – um clássico “jabuti”. O sistema nacional de energia foi obrigado a adquirir 8 gigawatts produzidos por usinas que serão instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Investimentos pesados serão necessários para abastecer as termelétricas com gás e distribuir a eletricidade que elas produzirem. Tudo isso para incentivar um modal energético que, vamos repetir, é caro e superpoluente.
Os consumidores brasileiros pagarão a conta.
E quem são os beneficiários? Os donos das termelétricas, é claro, que agora têm pré-contratada a compra da sua energia. Mas, como foi largamente noticiado na época, o projeto não teria sido aprovado sem a inclusão das usinas no texto. Ou seja, diversos parlamentares condicionaram seu voto à existência do famigerado jabuti, o que significa que também eles enxergaram alguma vantagem no incentivo à criação das termelétricas.
Além da obsessão de Lula com a reestatização da Eletrobras, é bem provável que ele tenha deixado as termelétricas em segundo plano porque sabe que teria de arranjar encrenca com uma parte do Congresso para mudar as regras recém-criadas.
Outra hipótese: talvez ele ache que se trata mesmo de um bom negócio — restando saber como o PT, agora no governo, consegue tirar dele algum rendimento político.
O antagonista
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